POVO SÁBIO NÃO ALINHA EM DISPARATES: um artigo de José Eduardo Garcia Leandro.

por José Eduardo Garcia Leandro (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

Desde 1 de janeiro de 1986 que todos os Governos, sem excepção, deslumbrados com os dinheiros vindos de Bruxelas, somaram erros sobre erros, distribuíram subsídios e patrocínios por tudo o que era sítio, destruíram a máquina produtiva, inventaram empresas e fundações que de nada servem a não ser aos próprios beneficiados directos, montaram acções de formação e cursos que, em muitos casos, eram um logro, etc., etc.. Todos os portugueses sabem disto e muitas centenas de milhares se aproveitaram do bolo europeu, dentro da lógica jardinista de que eu aproveito e alguém há-de pagar. O Estado teria, julgavam, capacidades infinitas, ou então surgiria sempre a CEE com a sua acção protectora.

As máquinas partidárias, a todos os níveis, especializaram-se em tudo o que permitisse absorver mais dinheiro, as contas da Assembleia da República, as remunerações e reformas do seus Deputados, iam na mesma lógica, bem como as remunerações da banca, de alguns Tribunais e dos gestores das empresas públicas. Governos houve que como única solução para os problemas de alguns sectores usavam a injecção de mais subsídios. Racionalizar? Reorganizar? Reordenar? Integrar serviços semelhantes? Que conceitos mais estranhos…

Medina Carreira, Ernâni Lopes e outros, sempre com grande coerência, foram avisando do desastre que se aproximava; foram odiados como profetas da desgraça. Muitos foram afastados ou afastaram-se por iniciativa própria, mas tinham razão. Nesta irresponsabilidade colectiva, apenas o Tribunal de Contas, com Guilherme de Oliveira Martins, procurou coerentemente ter uma acção pedagógica e correctiva. É evidente que o balão teria de rebentar um dia; foi pena que Teixeira dos Santos, conhecedor do que se passava, não tivesse tido a força suficiente para enfrentar Sócrates na sua megalomania ignorante; este foi sendo ajudado pelos nins habituais de Vitor Constâncio, um dos grandes responsáveis pela situação que se criou. O Governo pós-Sócrates, qualquer que fosse a sua base de apoio, não teria soluções muito diferentes das do actual, independentemente dos seus erros, exageros facilmente perceptíveis e cálculos que saíram furados; o seu grande problema foi ter de implementar centenas de medidas num prazo excessivamente curto, por Acordo que não assinou. E sem conhecer bem a economia do País e a máquina do Estado. Neste quadro, o Governo vai fazendo o possível, o PS vai tentando sobreviver com algumas bandeiras de oportunidade (e, por, vezes, razão), o PCP e o BE ( agora muito defensores da soberania nacional, esquecendo o seu passado) sentem que chegou a altura de tudo jogar pois acreditam na grande revolução mundial do proletariado e alguns sindicatos ainda julgam que tudo se resolve com greves e manifestações (como seria bom voltar a 1975!).

Claro está que o Governo não é o melhor, havendo maus Ministros e Ministérios impossíveis, titulares em que o desconhecimento só se equipara à arrogância, além de pessoas que deviam ter vergonha (?) de estarem no Executivo. A contabilidade sobrepôs-se à política; ora a contabilidade serve para, no seu âmbito, controlar financeiramente os resultados das políticas a implementar e não o contrário. Tal só aconteceu porque estávamos à beira do abismo. Dito isto, começa a surgir um clamor de vozes com responsabilidades, mas perigosas, a pedir levantamentos populares, a intervenção das Forças Armadas, e alguns eternos privilegiados aproveitam para fazerem mais greves que a todos prejudicam e tentam paralisar o País, etc..

Mais uma vez, reafirmo que tal tal seria o caminho para asneira e nada resolveria; só se agravariam os problemas. O comportamento deve ser o oposto; milhões de portugueses sabem que só juntando esforços se ultrapassa esta crise, o que não podem fazer sozinhos. A Sociedade Civil tem o seu lugar e a PASC, congregando esforços, vem trabalhando há quase três anos nesse sentido.

Mas há duas condições básicas para o sucesso:

  • Que o Governo actue com mais sentido da realidade, de humildade e trabalhe com a comunidade, não se deixando isolar;
  • Que teremos que fazer o caminho das pedras ponteagudas, sempre dentro dos mecanismos constitucionais;

Um povo sábio, com tanta asneira repetida neste tipo de situações, não pode fazer mais disparates que tantos prejuízos nos provocaram ao longa da História.

Ao menos, por uma vez!

Lisboa, 20 de Julho de 2012.

A SOCIEDADE CIVIL E O PAÍS – VISÃO POLÍTICA, MAS APARTIDÁRIA, DUMA CIDADÃ: um artigo de Maria Perpétua Rocha.

por Maria Perpétua Rocha (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

As várias gerações nacionais têm-se defrontado, desde há algumas décadas, com crises de expectativas.

A crise actual é a mais séria da época contemporânea e, consequentemente, a que poderá suscitar perturbações da maior gravidade e imprevisibilidade.

Embora a maioria da elite política nacional atribua a responsabilidade do estado da crise em Portugal a fenómenos financeiros e económicos de abrangência mundial, qualquer cidadão descomprometido compreende ou intui que a crise nacional é profunda, anterior, e assenta na fragilização continuada dos pilares da sociedade portuguesa, sendo notório que interesses partidários menores, raramente movidos por ideologia, se têm sobreposto sistematicamente ao Interesse Nacional.

Comportamentos repetidos no tempo estão na origem da Crise de Valores que atinge o desempenho das Instituições, da Administração Pública e dos Partidos Políticos. Há muito que os Partidos Políticos parecem ter perdido a noção da sua natureza, a visão do serviço da causa pública e a prossecução do Interesse Nacional.

Diariamente, um qualquer cidadão comum assiste à forma como a governação, a justiça, os media se esgotam em casos que, ou configuram crimes graves de corrupção, lesivos do interesse nacional, ou, a não o serem, se reduzem a casos graves de difamação igualmente deletérios para os cidadãos, as Instituições, a Democracia e sobretudo para o País.

Assistimos continuamente ao corroer da intervenção política, confundida que é com a qualidade do desempenho de políticos.

Situações destas exigiriam actuação imediata, cirúrgica e eficaz, por parte do Presidente da República ou do Parlamento. Mas é visível que tal não está a acontecer!

Torna-se difícil para o cidadão comum vislumbrar a idoneidade, a experiência, as competências técnicas e a vontade num qualquer partido político para identificar um desígnio ou implementar uma visão estratégica para Portugal, particularmente no enquadramento complexo e rapidamente mutável do mundo global actual.

O País afunda-se no endividamento, tendo chegado ao extremo de assentar parte importante de um acordo internacional, para obter financiamento, num erro grosseiro resultante do ignorar de princípios fundamentais da Constituição; e, enquanto o desemprego continua a crescer, multiplicam-se os debates/reflexões e intervenções, no geral, vazios de soluções e as mais das vezes de raiz demagógica e alienante.

É também importante lembrar aos media que os portugueses sabem que alguns dos actores/comentadores estiveram ou estão indelevelmente ligados, de uma qualquer forma, às causas conducentes à situação actual.

Estamos num momento em que é indispensável que a União Europeia redefina políticas que permitam a sua própria sobrevivência, resolvendo problemas cruciais inerentes à política agrícola comum, ao desemprego, à falta de competitividade da base tecnológica e industrial de alguns sectores, à escassez e dependência de recursos energéticos e às alterações climáticas, à necessidade de inverter a evolução demográfica e sobretudo de como enfrentar o ataque ao sistema financeiro e económico de países da zona euro. Enquanto tudo isto deveria estar acontecer na Europa, em Portugal, os cidadãos comuns assistem a um contínuo definhamento da economia e das suas condições de sobrevivência e dignidade.

No centro do debate político deveria estar, actualmente, a forma como as medidas acordadas com a Troika estão a ser implementadas, particularmente, como é que se poderão criar medidas para alavancar as exportações ou manter os serviços básicos de um Estado Social, sem perda de eficácia, nomeadamente, nos sectores da saúde e educação; como serão identificados e supervisionada a eliminação de serviços redundantes do Estado; como serão levados a cabo as privatizações previstas assegurando o menor impacto sobre o interesse nacional; qual o plano e objectivos para o processo de racionalização da administração central, local e regional; quais as medidas propostas para a estabilização do sistema bancário; como serão protegidas as famílias mais desfavorecidas; que medidas para inverter a evolução demográfica do país.

 
No entanto, o País mergulha num debate menor, alimentado por condutas em que a ética parece estar ausente.

Só estando consciente das vulnerabilidades e potencialidades de Portugal no contexto dos espaços em que se integra, poderiam os portugueses ter identificado como o Governo se propõe implementar as soluções para Portugal e honrar os compromissos eleitorais.
 

Só compreendendo a Europa e o papel relevante que Portugal tem que desempenhar na sua consolidação e afirmação, poderiam os cidadãos comuns deste País, apesar dos sacrifícios que lhes são pedidos, dar o seu contributo, sem pessimismos ou desmobilização, levando ao relançar da economia portuguesa e da sua afirmação no mundo actual.

No entanto, tal não está a acontecer.

O pessimismo e a aparente desorientação dos portugueses são visíveis e justificáveis, mas creio que temporários.

A resistência, coragem, vontade, sofrimento, flexibilidade e sabedoria do povo Português serão alavancas que porão fim à crise actual. A Sociedade Civil em Portugal, à semelhança do que está a acontecer em outros espaços políticos do mundo ocidental, organizar-se-à de forma a moldar de novo uma democracia fundada nos princípios da igualdade, da solidariedade e da liberdade da iniciativa social, que reconduzirá o País ao papel que sempre teve e terá na História do Mundo.

Se recuarmos na nossa História, ela é pautada por crises que se repetiram, algumas das quais em situações ainda mais gravosas do que as actuais. A todas elas os Portugueses – cidadãos comuns – souberam responder. Fizeram-no através do reforço da consciência da identidade nacional, da identificação de projectos mobilizadores, agregadores do colectivo e afirmadores da vontade nacional, alguns dos quais identificados e desenvolvidos em divergência e, até em conflito, com os que, estando no poder, imprudentemente se auto-intitularam de Elites.

Esse é um papel que na história actual será reiniciado pelas Associações da Sociedade Civil.

OS VALORES FUNDAMENTAIS E AS CRISES PORTUGUESA E EUROPEIA: um artigo de Maria Perpétua Rocha.

por Maria Perpétua Rocha (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

Já não é possível ignorar os desequilíbrios do Poder entre as diferentes regiões do planeta e sobretudo entre a fragilidade política dos que são eleitos pelos cidadãos e os poderes informais que, na satisfação das suas motivações, promovem a mercantilização generalizada das palavras, da natureza e da cultura.

Os cidadãos europeus e dentre eles nós portugueses, embevecidos pela possibilidade de saciar a ambição natural de Ter mais e melhor, fomos estimulados a mergulhar num ciclo de Ter/Poder tornando-nos cada vez mais individualistas e egoístas mas simultaneamente mais frágeis e menos livres.

A solidariedade está fragilizada, os regimes democráticos em risco, o estado social em colapso, e nós temos vindo a adoptar, insidiosamente, um individualismo crescente, terreno fértil para o ressurgimento das ameaças com que a Europa se confrontou na primeira metade do século XX.

Sem nos apercebermos, as sociedades enveredaram por um sistema de comportamentos inerentes ao ilusório, fictício e desregulado mercado especulativo de capitais.

A Europa, inacabada na sua construção política, social e económica, parece recuar quase diariamente perante a agressividade da especulação financeira, esquecendo-se da economia real e de como esta, nas raízes profundas da democracia europeia, deveria ter como objectos últimos o desenvolvimento e o bem estar social.

A Europa encontra-se num estado de esgotamento histórico, paralisada perante o paradoxo de cenários crescentes de privação, sob o espectro de uma fronteira da miséria que se desloca cada vez mais para norte.

A Europa, “Berço da Democracia”, tem vindo a desvalorizar a Justiça e a Verdade, a por em causa Direitos Fundamentais e assim sendo atentando contra a dignidade e o patamar civilizacional que atingiu.

A crise europeia está a transformar-se numa crise civilizacional em que os valores que guiaram o seu desenvolvimento se encontram cada vez mais ignorados.

E nós, portugueses, que desvalorizámos sistematicamente o nosso legado histórico, a nossa cultura universalista e a nossa privilegiada posição geoestratégica, colocámo-nos perigosamente na linha da frente dos mais frágeis nessa enfraquecida Europa.

É na consciência desta nova realidade que o magistério da inquietação, o magistério da palavra dita e escrita, ganham nova importância pois é fundamental acordarmos da letargia sonâmbula e da inércia, refúgios traiçoeiros da impotência perante a crueza de um futuro que, de forma agigantada, nos esmaga.

Nós, cidadãos europeus, mas sobretudo portugueses, com a responsabilidade histórica de termos ligado o mundo naquele que foi o início da aproximação dos Povos, não nos podemos alhear desta realidade.

É fundamental que procuremos colectivamente formas eficazes de, não só de dizer basta, mas também, encontrar novas soluções a que não sejam alheias uma Filosofia de Cultura e o primado do Ser, retomando a caminhada em direcção à Justiça, à Paz e  ao Desenvolvimento Cultural e Social.

Lembrando Manuel Antunes e o seu “Repensar Portugal”, este mantém a actualidade do momento em que foi escrito.

Considero, por isso, fundamental que nós portugueses retomemos o Caminho em direcção a:
 

  • Uma Sociedade que não maximize o lucro e não sacralize o poder de circunstância;
  • Uma Sociedade em que a liturgia do Ser vá eliminando a do ter e a do parecer;
  • Uma Sociedade em que a política não se encontre desvinculada da ética;
  • Uma Sociedade em que a economia tenha uma dimensão ética e uma dinâmica solidária;
  • Uma Sociedade que não se encontre cindida entre a miséria e o consumo;
  • Uma Sociedade em que o Homem não seja reduzido a um número de série, a um contributo anónimo de uma qualquer estatística de desemprego;
  • Uma Sociedade em que a memória, o nascer, o amor e a morte não sejam apenas scripts de uma qualquer série televisiva substituta do que nos é alienado na vida real;
  • Uma Sociedade que não transforme em áreas de negócio obrigações sociais que são por essência de natureza pública, porque de Direitos Fundamentais se trata;
  • Uma Sociedade consciente da humanidade de todos os homens cuja riqueza máxima é a heterodoxia de cada um dos que a compõem.

É necessário que nós, Cidadãos, nos empenhemos e exijamos a criação de novas formas de Solidariedade, tais como:

  • Uma “Solidariedade de Resistência” tendo como objecto a Justiça social;
  • Uma “Solidariedade Cosmopolita”, tendo em atenção a coexistência das diferenças étnicas, religiosas e geracionais nas grandes Metrópoles;
  • Uma “Solidariedade Ecológica”, tendo como objecto a salvaguarda do Planeta;
  • Uma “Solidariedade Cultural”, instrumento fundamental de aproximação dos Povos;
  • Uma “Solidariedade Social”, que tenha em conta a necessidade de criar formas de desenvolvimento que combatam o desemprego e a miséria nos seus diferentes contornos.

É necessário que contrariemos colectivamente o determinismo que estamos a viver, o que pressupõe sermos capazes de introduzir uma alteração radical do paradigma para que nos empurram. Organizados, em torno da mudança de rumo necessária, nós Cidadãos criaremos as sinergias sociais e políticas para que tal aconteça.

Nós, cidadãos portugueses, temos a responsabilidade de fazer com que a primazia política se recentre de novo em garantir o primado dos Valores do Homem e da Vida.

SOCIEDADE CIVIL, UMA NOVA ATITUDE: um artigo de Mendo Henriques.

 

por Mendo Henriques (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

Foto em http://www.publico.pt
Portugal enfrenta uma fase crucial da sua história recente. Só a conseguirá enfrentar com sucesso se transformar as condições adversas na oportunidade de uma transição de fundo, que permita moldar um país cheio de história e cultura num país com futuro. Do sucesso desta transição vai depender o futuro dos portugueses e o seu papel no mundo.

Nesta oportunidade, a Sociedade Civil tem um primeiro papel decisivo: formular as questões de que dependem o nosso futuro: porque chegámos onde chegámos, e como podemos transitar para um Portugal melhor.

Os dois sectores que tradicionalmente forneciam este mapa das estradas do futuro estão em crise. Quem Governa tem que se confrontar com uma realidade em que as suas promessas políticas são rapidamente questionadas. Quem gere a Economia tem que se confrontar com a perda de confiança do público na generalidade dos agentes e porta voz económicos. E por isso, a formulação das grandes questões tem que ser devolvida a um terceiro sector, o das associações da sociedade civil, que têm a vivência diária dos problemas e o desinteresse que lhes permite promover o bem comum.

Que o discurso das elites políticas e económicas tenha deixado de ser convincente, não se deve sobretudo a uma impreparação ou prevaricação dessa elites, como frequentemente afirma o discurso populista. O problema central não é de ignorância nem de ganância, muito embora existam casos de erros nas políticas públicas, que devem ser denunciados, e casos de enriquecimento ilícito, que devem ser perseguidos intransigentemente pela justiça. O problema é outro.

A meu ver as questões centrais resultam de, nos últimos 20 anos, a vida política e económica portuguesa ter proporcionado a criação de um sector e de uma classe dominante que se alimenta do controle do mercado interno. É que se percebe pelos lóbis que se movimentam nos sectores de bens não transaccionáveis, e que não têm uma administração pública de qualidade a regulá-los, estando, pelo contrário, infiltrada por grupos de interesse. Esse controle está “repartido” por diferentes agentes e são estes que se auto-controlam e se digladiam na comunicação social.

Este controle subterrâneo está sempre a aflorar nas notícias. Não precisamos de muita ciência para saber que ”Zangam-se as comadres, sabem-se as verdades”…Um défice regional, uma escuta das polícias, o aumento do preço da eletricidade, a baixa da TSU, etc.. A opinião pública recebe estes acontecimentos fragmentados pelos media. Mas a sociedade civil tem que ajudar a criar critérios de relevância para que se distinga de imediato entre a “espuma dos dias” que interessam a alguns e as questões que interessam ao bem comum.

CONHECER · AGIR · MUDAR: um artigo de João Salgueiro, Presidente da Assembleia Geral da SEDES.

por João Salgueiro (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem).

 

Podemos hoje debater a importância das identidade e valores na relação de Portugal com o Mundo. Mas, face à presente realidade, tal não é possível sem primeiro reflectirmos sobre a relação de Portugal consigo próprio e dos portugueses com o seu País.

Temos vivido nos últimos anos mergulhados numa crise aguda. Para além da exigência de consolidação das finanças públicas, subsiste, há mais de dez anos, o desafio fundamental que resulta da estagnação da economia e da perda de competitividade. Sem garantir condições de crescimento económico não será possível resolver o problema do desemprego, nem o desequilíbrio da balança externa, nem o próprio défice das finanças públicas.

É possível, no entanto, encontrar na actual situação factores de optimismo que possibilitam alicerçar, com realismo, um desempenho positivo. Desde logo porque mais portugueses compreendem, finalmente, que defrontam um problema com consequências que não podem ser ignoradas.

Maior consciência da realidade que defrontamos, permite que os portugueses queiram começar a procurar melhores caminhos para o futuro. Percebemos, cada dia com mais clareza, que é indispensável concentrarmo-nos na busca e concretização de soluções verdadeiras.

O elemento decisivo de uma nova estratégia – esgotada que se encontra a ilusão de que o nosso crescimento pode assentar na despesa pública – é a necessidade de desbloquear a capacidade de iniciativa dos portugueses. Demasiado tempo, os agentes económicos têm permanecido dependentes do Estado para auxílios e subsídios, ao mesmo tempo que os seus projectos são entravados por vários departamentos de diferentes Ministérios.

Na base de uma mudança que configura tão profunda alteração comportamental, encontra-se um problema político e também um problema moral. Não será possível corrigir a natureza das leis e assegurar o seu efectivo cumprimento sem uma verdadeira responsabilização do Governo face à Assembleia da República e dos deputados face aos seus eleitores. Tal não acontecerá se a carreira dos membros do Parlamento continuar a depender mais da sua inclusão em posição elegível nos boletins de voto do que das opções dos cidadãos – e a reforma da lei eleitoral dificilmente terá lugar sem uma regeneração das estruturas e da vida partidária, o que está bem longe de parecer provável.

A regeneração da vida política não terá lugar sem uma forte determinação e intervenção activa dos próprios eleitores. Num sistema democrático – em que temos procurado viver desde 1975 – as orientações políticas e as decisões governamentais devem procurar aproximar-se da preferência dos eleitores.

Mas tal só acontecerá em Portugal, como se verifica em outros Países, se os eleitores puderem aceder a informação verdadeira e quiserem monitorizar as realizações dos Governos e o cumprimento dos seus programas eleitorais.

Demasiado tempo, temos coexistido com o esquecimento dos nossos Valores, da nossa História, da dimensão marítima de Portugal, do valor da nossa Língua e da nossa Cultura. É necessário recuperar o seu papel para catalisar a retoma da confiança dos portugueses, para assumir com confiança uma nova estratégia para Portugal, mais ambiciosa e realista, à medida dos desafios globais de que nos temos alheado excessivamente.

"PORTUGAL ATRAVESSA A MAIOR CRISE ECONÓMICO-FINANCEIRA DOS ÚLTIMOS 100 ANOS": Luís Campos e Cunha in "Portugal entre Gerações – Olhares inéditos de reflexão sobre o futuro do país", de Almerinda Romeira.

por Luís Campos e Cunha (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC, nem das associações que a compõem)

 

 

«Portugal atravessa a maior crise económico-financeira dos últimos 100 anos. Neste contexto, importa resolver e ultrapassar a crise actual, mas em simultâneo pensar o futuro. O que podemos e devemos fazer hoje para que o futuro seja melhor; o que podemos e o que devemos, como imperativo categórico, realizar e defender na acção cívica, seja esta individual ou organizada.
 
Esta crise económico-financeira com que nos debatemos e que está rapidamente a pôr em causa o bem-estar, o progresso e as Instituições na União Europeia e na América do Norte radica numa profunda crise política do funcionamento actual da democracia. A democracia, mais concretamente, os partidos existentes, não conseguem atrair os melhores para a causa pública. Se os partidos são a trave mestra da democracia, quando estes têm um mau desempenho é aquela que funciona deficientemente.

Temos de ser capazes de alcançar dois grandes objectivos. Primeiro conseguir a reforma dos partidos. Segundo é forçoso alcançar a separação do Estado dos interesses privados que o parecem controlar indevidamente. Desde logo para que os partidos se reformem temos que fazer pressão nesse sentido, através de uma opinião pública forte, esclarecida e organizada.

A democracia não se esgota na vida partidária. A dinâmica das Associações da Sociedade Civil e a participação cívica de cada um de nós pode fazer a diferença.»


Luís Campos e Cunha in AAVV, ROMEIRA, Almerinda (org.), Portugal entre Gerações – Olhares inéditos de reflexão sobre o futuro do país, SEDES – Babel, Lisboa, 2011.