por Renato Epifânio (Este texto representa apenas o ponto de vista do autor, não da PASC – Casa da Cidadania, nem das Associações que a compõem).
Excelentíssimo Senhor Luiz Inácio Lula da Silva,
Cada vez mais digo: já nada me espanta, mas ainda há coisas que me surpreendem.
A última das quais foi a declaração de Vossa Excelência, que, numa recente Conferência em Madrid, organizada pelo jornal El País, resolveu comparar as colonizações portuguesa e espanhola no continente americano, fazendo o seguinte balanço:
“Eu sei que isto não agrada aos portugueses, mas Cristóvão Colombo chegou a Santo Domingo [actual República Dominicana] em 1492 e em 1507 já ali tinha sido criada a Universidade. No Peru em 1550, na Bolívia em 1624. No Brasil a primeira universidade surgiu apenas em 1922.”
Muito para além das incorrecções factuais – logo a partir de 1559, e durante dois séculos, os Jesuítas fundaram no Brasil uma série de Colégios com uma qualidade de ensino equiparável a qualquer Universidade (basta dizer, para o atestar, que foi num desses Colégios que, em Salvador, o Padre António Vieira se formou) – e da deselegância diplomática – fazer uma declaração destas em Madrid é, por si só, um tratado de anti-diplomacia –, o que mais surpreende nesta declaração é a atitude.
Só faltou a Vossa Excelência ter culpado igualmente a colonização portuguesa por toda a corrupção que mina o sistema partidário brasileiro.
Quase duzentos anos depois da descolonização (1822), convenhamos que insistir nesta ladainha é mais do que ridículo.
Será por acaso esta a estratégia de defesa da cúpula do Partido de Vossa Excelência perante todas as acusações de corrupção?! Se for, começarei a acreditar que o PT – Partido dos Trabalhadores é mesmo o Partido da corrupção e não – como (ainda) considero – que a corrupção é algo que mina todo o sistema partidário brasileiro, por diversas razões – desde logo, devido um sistema eleitoral que promove uma excessiva fragmentação parlamentar.
Mas adiante. Numa próxima conferência em Madrid, espero que Vossa Excelência tenha a oportunidade de dissertar sobre a seguinte questão:
Por que será que todo o espaço colonizado por Espanha na América Latina se fragmentou em mais de uma dezena de países e que todo o espaço colonizado por Portugal – equiparável em termos geográficos – se manteve unido até hoje?
Será que Vossa Excelência alguma vez pensou nesta questão? Se nunca pensou nisso, sugiro-lhe que pense. Decerto, vai descobrir, para sua surpresa, alguns méritos na colonização portuguesa. E concluir que, tivesse sido a colonização espanhola, o Brasil já não existiria há muito. O que (não apenas) para o seu currículo teria sido lamentável.
Por último, uma adivinha. Numa entrevista publicada no jornal Diário de Notícias (20 de Julho de 1986), Agostinho da Silva faz uma muito sugestiva referência a um Presidente brasileiro – nos seguintes termos:
«O Presidente […], numa entrevista que deu, quando lhe perguntaram se ele censurava alguma coisa na colonização portuguesa (esta palavra colonização é perigosa, quando se trata do Brasil; eu acho que não houve colonização!), mas quando lhe perguntaram o que é que ele censurava na colonização portuguesa, […] disse: “Censuro que eles não tenham subido os Andes, descido do outro lado e tomado conta do Pacífico!”. E eu estou inteiramente de acordo!».
Sabe Vossa Excelência o nome desse Presidente do Brasil? Uma ajuda: não se chamava Luiz Inácio Lula da Silva.